TRIBUNAL
ADMINISTRATIVO DE CÍRCULO DE CAPITAL
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ASSUNTO:
SENTENÇA
Proc.
Nº 4422/15.tacc
|
Ação
administrativa de impugnação de norma e condenação ao
pagamento de indemnização
|
20
dezembro 2015
|
Autores:
Jeremias Feliciano
da Silva e Associação de Empresários Tuk-Tuk
Demandados:
Município
de Capital
e Associação de Taxistas de capital
|
Votação:
Unanimidade
Observações:
Apensação de Ações
Texto
Integral
Acordam
os juízes que compõem a secção de Contencioso Administrativo do
Tribunal Administrativo de Círculo de Capital:
I.
RELATÓRIO
JEREMIAS
FELICIANO DA SILVA,
portador do cartão de cidadão n.º 19198868, com o NIF n.º
524246480, com domicílio na Rua dos Condutores, n.º 19, 4.º
Direito,2666-666, Capital, ao abrigo do artigo 73º/1 do Código de
Processo nos Tribunais Administrativos (doravante CPTA), representado
judicialmente por Ana Messias, Diana Carlos, Catarina Soares, João
Pinto e Vanessa Fonseca, todos advogados da Sociedade PLMJ – Para
Lidar Melhor com a Justiça,
Sociedade
de Advogados, R.L., com sede na Avenida da Liberdade, n.º 666,
assistido por,
ASSOCIAÇÃO
DE EMPRESÁRIOS TUK-TUK,
com sede na Rua do Alecrim, nº7, 2º Frente, na Freguesia de São
Mamede,1200-056 Lisboa, com o NIF nº 204513821, representado pelo
seu Presidente, João Buda da Silva, divorciado, residente na Rua da
Marginal, nº3, Oeiras, 3810-056, com o Cartão de Cidadão nº
142622996, e NIF 786543219, representado judicialmente por Catarina
Martins, Verónica Santos, Rute Andrade, Patrícia Campos e Manuel
Mota, todos advogados da PCMV Sociedade de Advogados, S.A, com sede
na Avenida da Liberdade, nº 48, 2º andar,
intentaram
Ação
Administrativa
contra:
MUNICÍPIO
DE CAPITAL,
pessoa coletiva 125 854 956, sedeado na Avenida Legalidades Capital,
nº 1, 1999-009, Capital, representado pelo Presidente da Câmara
Municipal de Capital, Joaquim Substituto, nos termos do artigo 35º
nº 1 alínea a) da lei 75/2013 com a redação da mais recente Lei
69/2015, que estabelece o Regime Jurídico das Autarquias Locais e
patrocinado judicialmente pelas advogadas Daniela Cruz, Inês Santos,
Mara Santos e pelos advogados António Baptista e Francisco Almeida
pertencentes à sociedade Rebelo Cavaco & Associados,
e
identificaram como contrainteressado
nos termos do artigo 10º nº1 do CPTA,
ASSOCIAÇÃO
DE TAXISTAS DE CAPITAL,
com sede na Avenida Uber Lovers, nº87, 1888-888 Capital, com o NIF
nº 984637289
Petições
Iniciais apresentadas pelos autores JEREMIAS
FELICIANO DA SILVA
e ASSOCIAÇÃO
DE EMPRESÁRIOS DE TUK-TUK,
foram apensadas, ao abrigo do artigo 28.º do CPTA, em Despacho
devido e alvo de notificação, pelo que intentaram
cumulativamente, segundo o artigo 4º nº 1 do CPTA, Ação
Administrativa de Impugnação de Normas e de Condenação ao
Pagamento de Indemnização ao
abrigo dos artigos 37º nº 1, alínea d) e 72º nº 1 do CPTA.
Foram
deduzidos os seguintes pedidos:
-
Pedido constitutivo de impugnação de uma norma administrativa;
-
Pedido condenatório de pagamento de indemnização;
-
Pedido condenatório à prática de ato devido.
***
Da
legitimidade das partes
Dos
autores
JEREMIAS
FELICIANO DA SILVA
(A1) é, com base no plasmado no artigo 55º, nº1 do CPTA, parte
legítima no que à ação de impugnação de normas regulamentares
(cfr. o artigo 72º do CPTA) diz respeito.
Neste
ponto, advoga o autor ser titular de um interesse direto e pessoal,
lesado pelo Regulamento emitido pelo Presidente da Câmara Municipal
(cfr. o ponto
6.º da PI),
na medida em que, fundamenta o autor, as causas inerentes à emissão
de tal norma regulamentar não são, com efeito, justificáveis para
proibir a sua atividade (cfr. o ponto
16.º da PI).
Quanto
à autora ASSOCIAÇÃO
DE EMPRESÁRIOS TUK-TUK
(A2) de referir que é, à luz do propugnado nos artigos 73º, nº1 e
9º, nº2 do CPTA, parte legítima.
Dos
demandados
Quanto
à legitimidade passiva, cumpre mencionar que o MUNICÍPIO
DE CAPITAL
é, em face do exposto nos nos1
e 2 do artigo 10º do CPTA, parte legítima.
Relativamente
à legitimidade passiva da ASSOCIAÇÃO
DE TAXISTAS,
e considerando a posição anteriormente tomada em Despacho Saneador,
considera o Coletivo que aquela é, com efeito, contrainteressado,
nos termos do artigo 10º, nº 1 do CPTA, porquanto se admita a
existência de um manifesto interesse contraposto ao dos autores.
***
São
alegados pelos AA. vários vícios procedimentais do Despacho,
designadamente,
-
Violação do direito de audiência prévia dos interessados que
consta do art. 100º/1 do Código de Procedimento Administrativo
(CPA) (pontos
20º, 54º e 59º da Petição Inicial de A1 e pontos 5º e 22º da
Petição Inicial de A2);
-
Violação do princípio da imparcialidade, constante do art. 9º do
CPA, em virtude de o Presidente da Câmara de Capital, aquando da sua
atuação, ter tido em conta interesses particulares, a pedido do
Presidente da Junta de Freguesia de Santa Maria Maior (ponto
63º e da Petição Inicial de A1);
-
Incompetência absoluta do MUNICÍPIO
DE CAPITAL
na emissão do despacho, por falta de atribuição; neste prisma,
reiteram os AA. que a competência pertencia à pessoa coletiva
Estado, através do seu órgão Governo e não à supra
mencionada pessoa coletiva MUNICÍPIO
DE CAPITAL,
violando, enfim, a norma constitucional constante do artigo 198º,
nº1, al. a) da CRP (ponto
64º e da Petição Inicial de A1);
-
Violação do princípio da proporcionalidade, consagrado no artigo
266º, nº2 da CRP, bem assim, no artigo 6º do CPA, na vertente da
necessidade e na vertente da adequação (pontos
70º a 76º da Petição Inicial de A1)
Apresentando
contestação, o Demandado e o Contrainteressado alegam,
essencialmente, o seguinte,
-
Nos termos prefigurados na alínea c) do nº3 do artigo 100º e do
nº1 do artigo 101º do CPA, quando o número de interessados seja de
tal forma elevado que a audiência seja de tal forma incompatível,
há lugar a consulta pública (nos termos do supra
mencionado artigo 101º, nº1 do CPA), que teve lugar através de
Edital publicado no sítio digital da Câmara Municipal de Capital
(ponto
5º da Contestação do Contrainteressado) devendo
os interessados dirigir, por escrito, as suas sugestões ao órgão
com competência regulamentar, no prazo de 30 dias, a contar da data
de publicação do projeto. Ora, tal não aconteceu da parte da
ASSOCIAÇÃO
DE EMPRESÁRIOS TUK-TUK,
sendo que a ASSOCIAÇÃO
DE TAXIS DE CAPITAL
vem também alegar que nenhum interessado foi pessoal ou
individualmente notificado para se pronunciar sobre aquele despacho
(ponto
24º da Contestação do Contrainteressado);
-
O Presidente da Câmara de Capital tem competência para proferir o
Despacho nº 068/15, segundo os artigos 23º, nº2, alínea c), 33º,
nº1, alínea qq) e 34º, nº1 da Lei 75/2013, com a redação mais
recente da Lei nº 69/2015 e da Resolução 235/2015, secção
A-24/25 (ponto
27º da Contestação do Demandado e ponto 22º da Contestação do
Contrainteressado);
-
A elaboração do despacho não se iniciou com a recomendação
emitida pelo Presidente da Junta de Freguesia de Santa Maria Maior,
mas sim em virtude de sucessivas reclamações anteriores a 3 de
março de 2015, data da recomendação do Presidente da Junta da
Freguesia de Santa Maria Maior (ponto
16º da Contestação do Demandado);
-
O indeferimento da pretensão de A1 relativa ao requerimento por si
enviado ao Presidente da Câmara de Capital dá-se pela não obtenção
de licença por parte do supra
mencionado Autor, sendo esta a única solução possível, nos termos
do artigo 142º, nº2 do CPA (pontos
23º e 24º da Contestação do Demandado);
-
A entidade demandada contesta, outrossim, a Petição Inicial de
JEREMIAS
FELICIANO DA SILVA,
expondo
que o despacho relativo à matéria referida é o despacho nº068/15
e não o despacho nº11/2015 (ponto
19º da Contestação do Demandado)
***
Da
Competência do Tribunal
Dispõe
o artigo 13º CPTA que o «âmbito
da jurisdição administrativa e a competência dos tribunais
administrativos, em qualquer das suas espécies, é de ordem pública
e o seu conhecimento precede o de qualquer outra matéria».
Ora,
cumpre, numa primeira instância, referir que a competência é
fixada, nos termos prefigurados no nº1 do artigo 5º do Estatuto dos
Tribunais Administrativos e Fiscais (ETAF). Destarte, o tribunal é,
pois, competente em razão da jurisdição, nos termos dispostos nas
als. a)
e
b)
do
nº1 do artigo 4º do ETAF.
No
tocante à competência em razão da matéria, considera-se este
tribunal competente, por se tratar de matéria administrativa.
Outrossim,
quanto à competência em razão da hierarquia, importa atender ao
artigo 44º do já referenciado ETAF, segundo o qual se considera
este tribunal competente.
Finalmente,
cumpre analisar a competência em termos territoriais. Assim, para as
ações de impugnação de normas dispõe o artigo 20º, nº1 do
CPTA, que é competente o tribunal
da
área da sede da entidade demandada. Por via do disposto,
considera-se este tribunal competente.
II.
DOS
FUNDAMENTOS DE FACTO
Considerando
o que foi alegado pelas partes, o tribunal considerou como relevantes
para proferir uma decisão de mérito, os factos que ora se
apresentam:
-
JEREMIAS FELICIANO DA SILVA é um condutor de Tuk-Tuk, inscrito na ASSOCIAÇÃO DE TUK-TUK ECOLÓGICOS, desde 6 de janeiro de 2013;
-
No mesmo mês, e recorrendo a crédito bancário, adquiriu um veículo da série ThunderTuk;
-
JEREMIAS FELICIANO DA SILVA realiza, desde então, roteiros turísticos por si desenvolvidos;
-
O A1 realizava a sua atividade diariamente no período compreendido entre as 9h e as 21h, não ficando, pois, provado o desrespeito por tal horário;
-
O negócio era viável e lucrativo;
-
A 1 de outubro de 2015 foi proferido o Despacho nº 068/15 por Joaquim Substituto, Presidente da Câmara Municipal de Capital.
-
O despacho visava a regulação das condições de circulação dos veículos afetos à animação turística, em especial o controlo do tráfego excessivo dos mesmos e do estacionamento abusivo nas zonas abrangidas;
-
No mais, o Despacho foi emitido com o propósito de controlar os níveis de poluição sonora e atmosférica;
-
Alega o autor JEREMIAS FELICIANO DA SILVA que, por via deste despacho, a sua atividade fica limitada, porquanto são os bairros afetos por tal diploma que apresentavam a maior procura;
-
Os roteiros realizados pelo autor JEREMIAS FELICIANO DA SILVA incluíam pelo menos um destes bairros como ponto dos trajetos;
-
Destarte, alega ainda o A1 que a restrição imposta pelo Despacho culminou numa queda significativa das receitas da sua atividade;
-
Descontente com tais restrições, JEREMIAS FELICIANO DA SILVA realiza um requerimento onde pede que lhe seja concedida uma exceção, requerimento este prontamente indeferido pelo Presidente da Câmara Municipal de Capital;
-
Verifica-se que o Regulamento nº21/81, “Regulamento Municipal de Urbanização, Edificação e de Taxas e Compensações Urbanísticas do Concelho”, foi aprovado a 2 de fevereiro de 1981, por deliberação tomada na reunião ordinária da Câmara Municipal de Infâmia (Anexo 10 da Contestação do Demandado);
-
Considera-se verificado que o Regulamento nº21/81 regula a atividade de transporte de passageiros em veículos Tuk-Tuk;
-
Concretizam-se as parcerias estabelecidas entre a ASSOCIAÇÃO DE EMPRESÁRIOS DE TUK-TUK e a Câmara Municipal de Capital, bem assim com alguns restaurantes sitos no centro histórico da cidade (Documentos 1, 2, 3 e 4 da PI de A2);
-
O Despacho nº 068/15 foi elaborado tendo por base várias queixas e problemas relacionados com moradores dos bairros do município de Capital e associações representativas dos mesmos, relativos à circulação e tráfego dos triciclos e veículos ciclomotores de afetação turística, denominados Tuk-Tuk, nomeadamente nos bairros da Misericórdia, Castelinho e Alfombra;
-
O principal fluxo de reclamações provém das zonas de intenso tráfico de turistas;
-
Verifica-se que o despacho em questão exige que veículos afetos à animação turística sejam portadores da licença “Vasco Pereira” (Anexo 7 da Contestação do Réu);
-
Verifica-se que a responsabilidade da emissão da licença “Vasco Pereira” é do Turismo de Portugal, IP., conforme indicado no já supra mencionado Anexo 7 da Contestação do Demandado e cfr. o Decreto-Lei nº 108/2009, de 15 de maio (Regime Jurídico da Animação Turística), com as alterações que lhe foram introduzidas pelo Decreto-Lei nº 95/2013, de 19 de julho;
-
O veículo de JEREMIAS FELICIANO DA SILVA não possui a licença “Vasco Pereira”;
-
A licença era de fácil aquisição uma vez que, segundo declarações do Presidente da Câmara Municipal, só custava 2 (dois) euros e a sua obtenção verificava-se de um dia para o outro (Prova Testemunhal);
-
As quebras de receitas e o incumprimento das obrigações alegadas por A1, nos pontos 13º e 15º da sua PI, derivam de outro facto que não a obtenção da licença “Vasco Pereira”;
-
O projeto do Despacho nº 068/15 foi objeto de consulta pública no sítio institucional do Município de Capital e no Boletim Municipal (Anexos 8 e 9 da Contestação do MUNICIPIO DE CAPITAL e Anexos 3 e 4 da Contestação do Contrainteressado);
-
O prazo para a audiência dos interessados iniciou-se a 1 de junho de 2015 (Anexo 8 da Contestação do MUNICÍPIO DE CAPITAL e Anexo 3 da Contestação do Contrainteressado);
III.
DOS
FUNDAMENTOS DE DIREITO
DO
PEDIDO DE DECLARAÇÃO DE ILEGALIDADE COM FORÇA OBRIGATÓRIA GERAL
Da
audiência dos interessados
A
audiência dos interessados constitui um direito basilar, sendo
obrigatória num procedimento regulamentar por força do artigo 100.º
do CPA, decorrendo, como referido pelos AA., dos princípios da
participação (artigo 12.º do CPA) e da colaboração com a
administração (consagrado no artigo 11.º do CPA). Assim, os
particulares devem ser chamados a intervir no procedimento,
participando ativamente na formação da vontade da administração.
Por existir um número elevado de interessados (artigo 100.º, nº3
alínea c) do CPA) o projeto deve ser submetido a consulta pública
ao abrigo do artigo 101.º/1 do CPA.
A
doutrina tem considerado o "direito" de audiência prévia,
consagrado no art. 100.º do CPA, como um princípio estruturante da
lei especial sobre o processamento da atividade administrativa,
traduzindo a intenção legislativa de atribuição de um "direito
subjetivo procedimental" (cfr. Vieira
de Andrade,
Os
Direitos Fundamentais na Constituição Portuguesa de 1976,
Coimbra, 1983) e de garantia constitucional dos particulares
(cfr. Vasco
Pereira Da Silva, Em
busca do ato administrativo perdido,
1995), consagrado no artigo 267º, nº5 da Constituição da
República Portuguesa e concretizado no artigo 100º do CPA.
Ambos
os AA alegaram falta de audiência dos interessados, o que fora
refutado por prova documental apresentada pelos demandados (Anúncio
de Consulta Pública no Boletim da Câmara Municipal da Capital em
anexo da Contestação apresentada pelo Demandado Município da
Capital (anexo
9)
e pela contestação apresentada pela Associação de Taxistas (anexo
3).
Destarte,
ficou provado neste Tribunal que fora publicada a abertura do
procedimento, havendo oportunidade dos interessados, nomeadamente os
AA terem conhecimento do mesmo e fazerem-se ouvir, através do edital
no sítio www.cm-capital.com,
pelo que a alegação dos AA de desconhecimento do despacho para, nos
termos do art. 100.º, nº1 CPA se pronunciarem sobre o mesmo, não
procede.
O
edital foi publicado em Junho de 2015 e o Despacho n.º068/15 foi
emitido pelo Presidente de Câmara da Capital em Outubro do mesmo
ano, dando um espaço de tempo suficientemente aceitável de
proporcionar aos interessados a possibilidade de se pronunciarem
sobre o objeto do procedimento.
Da
competência para a emissão do despacho
A
delegação de poderes (art. 44.º e seguintes do CPA) consiste no
ato pelo qual um órgão, normalmente competente (art. 37.º do CPA)
para a prática de certos atos jurídicos, concede uma autorização
a um outro órgão ou agente, indicados por lei, a praticá-los
também, pressupondo que a lei a preveja; ou seja, depende de uma lei
habilitante, isto porque a delegação de poderes não pode resultar
da mera vontade de um órgão administrativo, uma vez que a
competência que lhe é conferida é irrenunciável e inalienável.
Sem essa habilitação a delegação é ilegal e os atos praticados
ao abrigo dela ficam feridos do vício de incompetência relativa,
geradora de anulabilidade (art. 135º do CPA)
Fora
alegada a incompetência do Presidente da Câmara de Capital para a
emissão do despacho, por parte do autor JEREMIAS
FELICIANO DA SILVA,
onde se argumentou que a competência do despacho era da competência
do Governo, por força do artigo 198.º, nº1 a) da CRP. Nessa senda,
cumpre referir que, de acordo com o artigo 342º, nº1 do Código
Civil (CC), o ónus da prova corre contra quem o alega, o que fora
contestado pela ASSOCIAÇÃO
DE TAXISTAS,
por via de exceção perentória, indicando a existência de
documento comprovativo da existência de delegação de poderes
(anexo
2 da Contestação apresentada pela Associação de Taxistas).
Destarte,
este Tribunal entende que tal despacho foi devidamente proferido pelo
Presidente da Câmara, no uso dos seus poderes delegados, tendo
presente a possibilidade de delegação de competências constar das
alíneas qq) e rr) do n.º 1 do artigo 33.º do RJAL – relativas à
administração do domínio público municipal e ao estacionamento de
veículos nas vias públicas e demais lugares públicos.
Da
imparcialidade da decisão
O
A1, JEREMIAS
FELICIANO DA SILVA,
alegou no sentido de uma atuação, segundo interesses particulares,
por parte do Presidente da Câmara na emissão do Despacho e a pedido
do Presidente da Junta de Freguesia de Santa Maria Maior, em violando
o artigo 143.º do CPA. No entanto, tal situação tem-se como não
provada. De facto, a um ponto, a prova documental apresentada pelo A1
(documento
8)
não se demonstra credível ou suficiente para o Tribunal; noutra
via, o Presidente da Câmara, mediante testemunho, referiu
desconhecer o Presidente da Junta de Freguesia de Santa Maria Maior.
Na esteira do disposto, o Tribunal dá como provada a inexistência
de qualquer relação entre os mesmos e, consequentemente, não se
verifica a existência de interesses particulares na emissão do
Despacho.
Assim
sendo, não se verifica, por parte do Presidente da Câmara de
Capital, qualquer situação de impedimento nos termos do artigo 69º
do CPA, uma vez que não se verifica qualquer fundamento para a
alegada falta de imparcialidade do Presidente da Câmara de Capital.
DO
PEDIDO SUBSIDIÁRIO DE CONDENAÇÃO À PRÁTICA DO ATO DEVIDO
Da
violação do princípio da proporcionalidade
O
princípio da proporcionalidade encontra-se consagrado no artigo
266º, nº2 da CRP e artigo 6.º do CPA, contendo três vertentes:
adequação, necessidade e equilíbrio.
Como
referido nos factos, o autor 1, JEREMIAS
FELICIANO DA SILVA,
ao verificar a emissão do despacho, realizou um requerimento para o
Presidente da Câmara Municipal de Capital, para que lhe fosse
concedida uma exceção. Tal requerimento foi, tal como dito supra,
indeferido pelo que, nos termos do artigo 67º, nº1 b) do CPTA, o
autor visa obter a condenação da administração à prática de ato
que lhe foi recusado, em cumulação com o pedido de impugnação de
normas, a título subsidiário, para tanto invocando a violação do
Princípio da Proporcionalidade na não concessão de exceção, para
si emitida. O autor 1 considerou violado o Princípio da
Proporcionalidade na vertente da necessidade, na medida em que a
administração deve optar pelas opções menos gravosas para os
particulares – facto que alega não ter ocorrido no caso concreto
–, e da adequação, alegando não existir linha clara entre os
motivos da proibição e o resultado, na medida em que a proibição
visa evitar o ruido, o que é contestado pelo Município da Capital
com a menção à licença “Vasco Pereira”. Neste ponto, cumpre,
enfim, referir que tal licença é considerada, por via do testemunho
do Presidente do Município de Capital, de fácil e imediata
obtenção.
Concomitantemente,
não se tem como considerar o ato da administração como ilegalmente
recusado ao AA 1, Jeremias Feliciano da Silva (artigo 66º, nº1 do
CPTA).
DO
PEDIDO DE RESPONSABILIDADE CIVIL EXTRACONTRATUAL
Relativamente
ao pedido de condenação da Câmara Municipal de Capital em
Responsabilidade Civil Extracontratual, nos termos dos artigos 37º,
nº1 k) do CPTA, cumpre, ab
initio,
aferir se, face às circunstâncias concretas, estão verificados os
pressupostos legalmente exigidos para a constituição do dever de
indemnizar.
Nessa
senda, foi alegada pelos AA a invalidade do Despacho com base na
falta de audiência prévia (exigida nos termos prefigurados no
artigo 144º do CPA), a falta de competência para a emissão do
Despacho e, por último, a imparcialidade por parte do Presidente de
Câmara de Capital, o que, tal como visto anteriormente, se
demonstrou improcedente. Destarte, o Presidente da Câmara, aquando
da emissão de tal Despacho, pratica um facto lícito.
Perante
este estado de coisas, e no entender deste Tribunal, não se têm por
verificados os pressupostos da existência de um facto e da ilicitude
do mesmo. De facto, e pese embora se terem como provados os danos na
esfera do autor JEREMIAS
FELICIANO DA SILVA,
cumpre mais uma vez referir que tais danos são imputados ao autor,
em virtude da sua inércia relativamente à obtenção da licença
“Vasco Pereira”.
Nessa
medida, e com base no exposto, o pedido de responsabilidade civil
extracontratual não pode proceder, por falta de pressupostos.
IV.
DECISÃO
Por
tudo o exposto, e sem necessidade de demais considerações, decide o
Coletivo, na égide do Poder de Autoridade que lhe é conferido pela
Constituição da República Portuguesa, nos moldes que ora se
expõem,
-
No que ao pedido constitutivo de impugnação de norma administrativa (em concreto, ao pedido de declaração de ilegalidade com força obrigatória geral) diz respeito, considera o Coletivo, por força do prefigurado no nº1 do art. 73º CPTA, improcedente, na medida em que se considera provado a existência de audiência de interessados nos termos do artigos 100º e seguintes CPA;
-
Quanto ao pedido de condenação à prática do ato devido, considera-se, outrossim, improcedente, por se ter cumprido o Princípio da Proporcionalidade;
-
Finalmente, quanto ao pedido de condenação ao pagamento de indemnização a título de responsabilidade civil extracontratual, decidiu o tribunal pela sua improcedência, dado não se encontrarem como provados os factos constitutivos da mesma
No
mais, condenam-se os autores a pagar as custas processuais nos termos
no disposto no artigo 527º e seguintes CPC e do Regulamento das
Custas Processuais DL nº 34/2008, de 26 de fevereiro.
O Coletivo de Juízes
(
Alexandra
Costa) (Ana Cruz) (Ariana Paraíso) (Tobias Lohse) (Tomás
Santos)
Capital, 20 de dezembro de 2015